Revdo. Rodson Ricardo Souza do Nascimento
Ecce exiit qui seminat, seminare. (Mc 4,3)
“Eis que o semeador, saiu a semear”. Tomo essa conhecida parábola evangélica para iniciar minha defesa da Primeira Comunhão na Igreja Anglicana no Brasil. Primeira comunhão entendida aqui como a preparação para a celebração em que os cristãos batizados, crianças ou adolescentes, receberam pela primeira vez o “Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo”, a Santa Eucaristia. Aproximemo-nos da parábola. A partir de elementos presentes na trajetória do ser humano, que Jesus nos fala, enfocando o Semeador, a Semente e os solos para, ilustrar a instabilidade dos homens.
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No texto, é narrado o labor de um semeador que lançou sementes em vários lugares, com diferentes resultados, dependendo do tipo do solo onde caíram. Etimologicamente, o termo semear vem do latim seminare, e significa: deitar ou espalhar sementes para que germinem. Enquanto o termo semeador significa, que, ou aquele que semeia.
Esta parábola é fonte inspiradora para uma igreja evangelizadora. “A semente é a palavra de Deus” (Lc 8,11). O semeador é Jesus Cristo. Ele anunciou o Evangelho na Palestina há dois mil anos e enviou-nos como seus discípulos a semeá-lo pelo mundo. Jesus Cristo hoje, presente na Igreja por meio do Seu Espírito, continua a divulgar amplamente a palavra do Pai no campo do mundo.
Eis o primeiro motivo. A urgência missionária. Uma igreja que relativize ou menospreze a evangelização, que tenha medo de crescer numérica e espiritualmente, está profundamente doente. Uma igreja que se preocupe apenas em atender a sua demanda interna, em gerir sua paca membresia está longe do seu propósito original e tem seus dias contados.
Portanto ao defender a importância da preparação para a primeira comunhão, em oposição, a prática mais recente da IEAB, pensamos em termos pastorais e missiológicos. Não pretendo adentrar no debate estrito que motivou seus críticos, sobre a originalidade ou não dessa prática na igreja antiga. Penso é na possibilidade de levarmos as boas – novas àqueles que estão distante ou fora da Igreja.
Sabemos que a qualidade do terreno é sempre muito variada. O Evangelho cai “à beira do caminho” (Mc 4,4), quando não é realmente escutado; cai “em solo pedregoso” (Mc 4,5), sem penetrar profundamente na terra; ou “entre os espinhos” (Mc 4,7), e é imediatamente sufocado no coração dos homens, distraídos por muitas preocupações. Não afirmamos ser essa a única saída para todos os problemas de nossa igreja. Porém, podemos afirmar através de nossa experiência pastoral que isso implica numa aposta na expansão e não no conformismo, no crescimento e não na manutenção eclesiástica. Hoje, sobretudo nas grandes cidades, falta, quase geralmente, o apoio da família e da sociedade para que as crianças tornem-se cristãs. Se o indivíduo não está inserido numa comunidade viva e se ele não tem a visão da eucaristia como celebração da vida, em geral a Igreja não tem muito sentido para ele.
Mas uma parte cai “em terra boa” (Mc 4,8), isto é, em homens e mulheres abertos à relação pessoal com Deus e solidários com o próximo, e produz frutos abundantes. Jesus, na parábola, comunica a boa notícia de que o Reino de Deus chega, não obstante as dificuldades do terreno, as tensões, os conflitos e os problemas do mundo. A semente do Evangelho fecunda a história dos homens e preanuncia uma colheita abundante. Jesus faz também uma advertência: somente no coração bem disposto a palavra de Deus germina.
A preparação para a primeira comunhão se faz nas comunidades, normalmente em grupos de crianças que são confiados a catequistas. As crianças reúnem-se semanalmente e recebem em geral, durante o ano letivo, aulas de catequese. Essas reuniões são dinâmicas, adequadas a cada faixa etária. Cria-se assim um lugar para atividades não apenas intelectuais, como desenho, canto, jograis. Procura-se também a ligação entre fé e vida, partindo da vida da criança e levando-a a uma vivência dos compromissos batismais que serão renovados na celebração da primeira comunhão. Igualmente dá-se valor à dimensão comunitária da vida cristã. E esta se procura viver particularmente no grupo que se está preparando, às vezes também junto com outros grupos iguais ou semelhantes da mesma comunidade.
Trata-se da primeira experiência de discipulado da criança, de iniciação à fé cristã. Jesus Cristo é colocado no centro desta iniciação como aquele de quem a criança se aproxima e a quem ela quer melhor conhecer e mais amar. As Escrituras são mostradas como modo prioritário e especial em que essa revelação acontece. Os Sacramentos são apresentados como os meios pelos quais a graça divina atua em nossas vidas, transformando-as constantemente.
E dentre esses sacramentos, sinais visíveis da graça divina, destaca-se a Santa Eucaristia. Portanto deve ficar claro e explícito que a Eucaristia, para a qual o grupo se prepara, é o ponto culminante de celebração da fé e da vida anglicana. Nas palavras de um famoso teólogo: “A Igreja celebra a eucaristia e a Eucaristia faz a Igreja”. A liturgia eucarística é o cume para o qual tende a ação da Igreja e, ao mesmo é a fonte de onde emana toda a sua força moral e espiritual.
A verdadeira Igreja é “Mãe e Mestra” da humanidade. Uma Igreja Cristã autêntica considera a Missão como a continuação daquela explosão de vida nova, de fé, esperança e amor desencadeadas no mundo pela vinda do Senhor Jesus Cristo, sua morte e ressurreição, e pela dádiva do Espírito Santo a todos (CCA/1971). E é participando na continuação dessa Missão que participamos na vida de Cristo. Para nós, anglicanos, a Missão deve ser explicitada hoje conforme os cinco pontos acordados pelo Conselho Consultivo Anglicano e reafirmados pela Comissão Anglicana de Missão, a saber: 1) Proclamar as boas-novas do reinado de Deus; 2) Ensinar, batizar e nutrir os fiéis; responder à necessidade pelo serviço que expresse o amor; 3) Procurar a transformação das estruturas injustas da sociedade; 4) Lutar para salvaguardar a integridade da Criação, sustentar e renovar a vida da terra.
A Expansão deve ser entendida como o crescimento qualitativo e quantitativo da Igreja, conforme esclarecido pelo Conselho Consultivo Anglicano que, em sua reunião de 1973, referiu-se ao “Crescimento da Igreja” como sendo, ao mesmo tempo, em números, em maturidade e em compromisso. Através de uma sólida preparação para a Eucaristia é possível atender este tríplice aspecto da expansão, como semente e fruto da Missão. Como os três últimos cinco pontos já vêm sido exaustivamente enfatizados pela província, creio que devamos também considerar a necessidade dos dois primeiros: 1) Proclamar as boas-novas do reinado de Deus; 2) Ensinar, batizar e nutrir os fiéis; responder à necessidade pelo serviço que expresse o amor.
Jesus nos envia hoje ao mundo inteiro assim como fora enviado pelo Pai dizendo: “Ide portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos” (Mt 28,18-20). A Igreja deve ensinar, porque seu fundador é “o Mestre dos mestres” e o “Senhor dos senhores”.
Fiel ao objetivo de apresentar Jesus como sendo o novo Moisés, porém, Mestre de um novo ensinamento, o evangelista observa que os Onze discípulos se encaminham para a montanha que o próprio Cristo lhes determinara. A única aparição do Ressuscitado aos Onze, segundo Mateus, passa a ser, então, um encontro marcado no monte a quem fala de sua autoridade sobre o céu e a terra e a quem transmite o poder de ensinar a todos e de batizar.
O contexto se assemelha, pois, à promulgação de uma norma: fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. Na verdade, temos um mandato ou uma ordem explícita de missão, calcada no senhorio universal de Cristo. Tal senhorio é recebido do Pai, manifesta-se no mandato e é reconhecido pelos discípulos que se prostraram. A Igreja recebe o poder de estender e dilatar a obra de Cristo em todo o mundo pelo ensinamento e o batismo no nome das pessoas divinas. Além disso, conta com a presença de seu Senhor até a consumação dos séculos.
Jesus veio até nós para nos abrir o caminho que nos leva ao nosso destino, que é o Pai. Se nos unirmos a Jesus, nele já estamos caminhando para o mesmo Pai. Hoje celebremos este Pai que nos cria para sim nos envia em missão de vida ao mundo e nos espera de volta, junto de sim para a plenitude da vida! Anunciemos a toda à humanidade esse caminho de vida! Mateus fala-nos hoje de onze discípulos. Sejamos nós esse grupo, sejamos o décimo segundo enviado a testemunhar Jesus, o Caminho de toda a humanidade até o Pai!