quarta-feira, 15 de junho de 2016

Sou um cristão anglicano (I)

Adriano Portela
Ontem, 14 de junho, completei um ano como anglicano pleno, isto é, como alguém que foi recebido oficialmente como membro da Comunhão Anglicana. Esperei um ano até ser recebido oficialmente na Igreja, o que significa que participo efetivamente há 02 anos na comunidade anglicana.
O que é a Igreja Anglicana? A designação se remete ao termo latino “Ecclesiae Anglicana” utilizado pela Igreja Católica Romana para se referir à Igreja da Inglaterra. Quando Henrique VIII, acompanhando a avalanche reformista do séc. XVI, declarou a autonomia da Igreja da Inglaterra em relação à Sé Romana, manteve-se a designação Igreja Anglicana para essa comunidade de fé que, daí em diante, passou a se entender uma Igreja católica reformada.  Razão pela qual não faz sentido perguntar se ela é uma igreja católica ou protestante.

Na manhã do dia 14 de junho de 2015, quando o Bispo da Diocese Anglicana do Recife, Dom João Peixoto Câncio Filho, perguntou a mim: “Crês que esta Igreja é parte da verdadeira Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica de Cristo”?, renovei tranquilamente minhas promessas batismais e professei o Credo Apostólico porque não se tratava de renunciar à fé católica, mas de assumir um novo modo de vivê-la. Já não sob a forma romana, mas sim sob a forma anglicana, que é enriquecida pelas transformações suscitadas na Reforma Protestante, que, inclusive, foi absorvida em grande parte pelo Concílio Vaticano II (1962-1965).

Comecei a pensar na amplitude do termo “católico” ainda quando bacharelando de Teologia, ao ler Presbíteros Hoje, de Dom Valfredo Tepe, no qual o autor afirmava que “o essencial é sempre transcendental e deve ser preservado” e que  “não é essencial que as formas ‘romanas’ ou ‘latinas’ em culto e disciplina sejam uniformemente impostas a todas as Igrejas novas”, uma vez que “o termo ‘latino’ designa uma realidade cultural, não uma instituição divina” (TEPE, 1993, p. 69).
Mais tarde, quando fiz um intercâmbio em Israel (Dez/2008 – Fev/2009), tive contato com as diversas Igrejas católicas sui iuris da Terra Santa (Católica Greco-Melquita, Maronita, Católica Síria,  Armênia Católica, Católica Caldéia) e seus respectivos Ritos, sem falar nas igrejas ortodoxas (Ortodoxa Grega,  Ortodoxa Armênia, Ortodoxa Síria, Ortodoxa Copta, Ortodoxa Etíope). Ficou, então, mais claro para mim aquilo a que se referia Dom Valfredo Tepe sobre as formas culturais da Catolicidade e o que é essencial.
A experiência em Israel foi uma chamada à essencialidade da fé, porque, por um lado, tive conhecimento da pluralidade da fé cristã católica, e por outro, aprofundei meus  conhecimentos bíblicos através do regaste das raízes judaicas do Cristianismo.  Isso me levou a uma decisão interior de me apegar ao que é essencial à fé. Desse modo, o intercâmbio significou o coroamento de um processo kenótico (de esvaziamento) por que passei durante todo meu período de formação presbiteral no Seminário Central São João Maria Vianney.
Perdoem-me a digressão, mas ela é necessária para responder como é possível que um sacerdote católico-romano, como eu era, sinta-se a vontade para se  tornar um cristão anglicano. Em outras palavras, sinto-me a vontade enquanto anglicano porque o Anglicanismo não prescindiu da catolicidade da Igreja de Cristo, entendida aqui primeiramente e de maneira muito restrita como universalidade da fé da Igreja, conforme o Credo Apostólico, que é, ao meu ver, o fundamental da fé cristã. O Anglicanismo reguarda essa catolicidade, sem elementos secundários de disciplina que tolham minha relação com Deus, vivida a partir da vocação específica para a qual Ele me elegeu.
Ao dizer o que disse até aqui, não explicitei as nuances do Anglicanismo, porque quis me ater a sua  participação na catolicidade da Igreja de Cristo, por isso, numa segunda parte do “Sou um cristão anglicano” especificarei mais outros elementos do Anglicanismo.
Adriano Portela dos Santos
* Post reproduzido do Conciliação